segunda-feira, 27 de novembro de 2017

Ónega, un antropónimo celta?

O nome de pessoa Eneko é considerado genuinamente vasco mas na Idade Media estava difundido por todo o norte da Península e aparece também em documentos galegos alto-medievais. A etimologia que se propõe é o posesivo ene “meu” mais um sufixo -ko diminutivo ou expressivo, embora outros investigadores aludam a uma origem genericamente pré-romana.
Em 1990 um membro de Arqueologia de Ferrado publicou a sua tese de doutoramento, em que se recolhia a inscrição dedicada ao deus Cosus Oenaecus e por primeira vez se relacionava com a palavra do irlandês antigo oenach. A semelhança entre Eneko e Oenaecus leva-nos a propor uma origem celta e não vasca para o antropónimo e para o correspondente nome de mulher –e apelido– Ónega.
 A inscrição, de época romana, foi achada em São Mamede de Seávia (Coristanco) e é a seguinte:
COSVO/OENAE/CO CLIVES/NEPOS/EX VOTO
Oenaecus aparece como epíteto do deus Coso e compõe-se do numeral celta *oinos, *oina, “un”, máis o sufixo -aecos -aikos, com o significado de “relativo a”. O numeral faz parte também do irlandês antigo oenach, hoje aonach, (assembleia, reunião, feira). O significado do epíteto, por tanto, seria “o da reunião”ou “o que reune”.
Já na época medieval, alguns exemplos de Eneko na documentação galega são EnnegoEnnegusEnnigus e o patronímico Ennegonis, em documentos de Lugo e Celanova do século X, e Enego/Enigo num documento do Tombo de Caaveiro do século XII.
A evolução de Oenaeco para Enego segue mudanças fonéticas normais do romance, com a particularidade de que deveu existir uma variante con duplo n para que em galego seja con n simple e em castelhano con ñ (Íñigo). A primeira sílaba é o ditongo oe, que se reduz, seguida do sufixo -aecus ou -aikos com um ditongo que tambén se reduz e a sonorização do som velar k, igual que na passagem de galaico a galego. O correspondente castelhano tem acentuação na antepenúltima sílaba, quer dizer, esdrúxula e seria, também a acentuação dos exemplos galegos medievais e antigo: Énego e Óenaecos, assim que este último soaria muito parecido com o latim unicus.
O mesmo nome que Énego, do qual só se diferença no timbre da primeira vogal, é Onega (pronunciado Ónega) que aparece assim escrito, por exemplo, no tombo de Caaveiro, no século XI, XII e XIII e nos documentos de São Pedro de Vilanova de Doção, também do s. XIII, bem como fazendo parte dum topónimo num documento de Santo Estevo de Choução (in loco quod dicitur Super Valle de dona Honega). Em documentos de fóra da Galiza aparecem variantes ditongadas, como Huenega, que poderia ser un resto do ditongo de Oenaecus ou bem uma ditogação romance posterior, e formas con i inicial como Yniga, Inniga.
Ónega conservou-se como apelido, com a acentuação na primeira sílaba, como corresponde. Segundo o Instituto espanhol de estatística (INE) onde máis abunda, com diferença, é nas províncias de Lugo, Crunha e Madrid, sen dúvida nesta última devido à imigração. Como apelido Óñiga está presente na província de Salamanca, o que parece confirmar o seu asentamento occidental. O feito de que tamén apareça como nome de lugar perto de Choução (Chouzán, concelho de Carvalhedo) é significativo do seu arraigamento. É possível que os lugares chamados Viladónega, Viladóniga e Viladonga que existem na Galiza possam derivar deste nome e não da etimologia geralmente aceite villa dominica (vila da senhora ou senhor).
Aínda que já se conhecia que o antropónimo Eneko não era exclussivamente peninsular, pois citam-se ocorrencias de Énego no norte de Italia, não temos noticía de que alguém o relacionasse com o irlandês antigo Oengus (hoje Aengus). O nome aparece testemunhado pela primeira vez num texto do s. XII que reflicte o estado língua do s. VIII. Óengus é un filho do Dagda e segundo Le Roux e Guyonvarc´h é un composto do numeral oenoin máis o substantivo gus, e o significado é “choix unique”, única opção ou única escolha.
Ora bem, tendo em conta que estes investigadores não conheciam a inscrição de Seávia e que nos vários séculos que separam Oenaecus de Oengus o irlandês sofreu, como é natural, mudanças, temos de considerar a possibilidade de que sejam o mesmo nome. É uma questão que fica aberta.

Já que estamos com o numeral celta oen, não podemos deixar de mencionar arcaismo ona dos documentos do mosteiro de Ramirães. Esta palabra, de etimologia escura, aparesce em documentos desse mosteiro em latim e galego entre os séculos XII e XIV, e desaparece depois substituído pola palavra abadessa. A investigadora portuguesa Clarinda de Azevedo, de quem estamos a tomar estes dados, pensa que pode derivar de miona, procedente da expressão latina mea domina e que se aplicava como título honorífico “às senhoras da mais alta nobreza”. A nós parece-nos que pode provir também do numeral oinosoina, pois a palabra comum dona significava “freira”, não “abadessa”, e ona, com o significado de única, senlheira ou superior conviría bem a um abadessa.

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